Fotografia e Saúde Mental: A conexão que continua crescendo em 2025
- Leo Saldanha

 - 13 de out.
 - 5 min de leitura
 
Depois de ser um dos temas que mais repercutiram em 2024, a relação entre fotografia e saúde mental segue ganhando força em 2025.

Hoje publiquei mais uma matéria exclusiva sobre a relação entre saúde mental, bem-estar e fotografia. O retorno foi imediato: vários membros compartilharam histórias de como a fotografia se tornou parte do próprio processo de cura, autoconhecimento ou reconstrução. Alguns relataram projetos terapêuticos, outros contaram como “fotografar salvou” momentos difíceis da vida.
Esses depoimentos confirmam o que a pesquisa e a prática já mostram: a fotografia tem um poder real de transformação e o tema segue ganhando força dentro e fora do universo artístico.
Essa nova repercussão de hoje me fez relembrar que em janeiro publiquei o artigo “Fotografia e saúde mental: A conexão entre clicar imagens e o cuidado emocional”, que já apontava esse movimento e agora novas pesquisas validam, estendem e aprofundam essa conexão.
O tema também foi explorado em outras matérias de grande repercussão no meu blog, como “Fotografia e saúde mental: A nova abordagem da Nikon” e “Revelando a cura: como a fotografia se tornou um refúgio na crise de saúde mental”. Essas publicações ajudaram a consolidar um debate essencial: o papel da fotografia como linguagem de expressão emocional e ferramenta de cuidado.

Mais que arte: fotografia como ferramenta terapêutica
A fotografia terapêutica vem se consolidando como uma prática reconhecida e estruturada. Estudos recentes mostram que o simples ato de fotografar pode:
Melhorar o humor
Estimular a reflexão sobre sentimentos
Somar significado à experiência de ser humano
Em 2025, o estudo “Coproduzindo autonomia dos adolescentes no cuidado em saúde mental a partir da Oficina Photovoice” investiga como o método Photovoice (que combina fotografia e narrativa) ajuda adolescentes em um CAPSi a expressarem suas necessidades e emoções.
Outro trabalho, “‘O que Alivia a Minha Dor’: Experiência de pesquisa por meio do Photovoice com adolescentes em sofrimento psíquico”, mostra como encontros fotográficos estruturados permitiram que jovens vissem e verbalizassem o que oferece alívio, produzindo um livreto coletivo com imagens e narrativas pessoais.

No plano internacional, o estudo “Exploring the Therapeutic Value of Photography as a Qualitative Inquiry” mapeia percepções de usuários de serviços de saúde mental sobre os efeitos terapêuticos da fotografia, suas potencialidades e limites.
Outro artigo conceitual, “Conceptual Photography in Therapeutic Photography”, mostra que o valor terapêutico está tanto no processo (o ato de fotografar, refletir e dialogar) quanto no resultado final.
E o ensaio clínico em curso TPARCT (Therapeutic Photography for Autistic Youth) busca mensurar impactos psicológicos e fisiológicos, como a variabilidade da frequência cardíaca, de intervenções fotográficas em jovens autistas.
Essas pesquisas convergem para mostrar que a fotografia pode funcionar como meio simbólico de expressão, uma ponte entre emoções internalizadas e o mundo externo.

O poder da atenção plena através das lentes
Fotografar exige presença: observar luz, cores, composições e detalhes.Essa prática se alinha aos princípios do mindfulness, uma forma de meditação ativa que convida à atenção plena e à conexão com o presente.
Ao focar o olhar no mundo, o fotógrafo se liberta da sobrecarga de pensamentos repetitivos. E assim reduzindo ansiedade e ruminação mental. O ato de fotografar se torna, assim, uma forma de foco e cuidado emocional cotidiano.

Dopamina, criatividade e bem-estar
Há também uma explicação neuroquímica para o impacto positivo da fotografia. Atividades criativas estimulam a liberação de dopamina, neurotransmissor associado ao prazer, à motivação e à sensação de recompensa.
É por isso que tantos fotógrafos relatam uma sensação de calma e satisfação após uma boa sessão de fotos: uma combinação de foco criativo e recompensa emocional que fortalece a mente tanto quanto a arte.
Conexão social: o lado humano da fotografia
A fotografia raramente é uma prática solitária e isso tem benefícios sociais claros para a saúde mental.
Grupos fotográficos, projetos coletivos e comunidades online criam redes de apoio e pertencimento
Iniciativas como The Mental Health Project e I Am Not a Label usam a fotografia para humanizar narrativas de saúde mental, quebrando estigmas e promovendo empatia
No Brasil a questão tambe repercute: Revelando a cura: Como a fotografia se tornou um refúgio na crise de saúde mental
Essas experiências mostram como a imagem pode ser tanto uma forma de expressão individual quanto um elo coletivo de empatia e escuta.

O outro lado da moeda
Nada é idealizado. A profissão fotográfica também traz riscos reais à saúde mental:
Prazos apertados, clientes exigentes e a instabilidade financeira podem se tornar fontes de estresse
Estudos apontam que até 25% dos fotógrafos enfrentam problemas de saúde mental relacionados à profissão, incluindo ansiedade, burnout e fadiga criativa. Mas minha sensação pessoal é de que no Brasil esse número pode ser maior (só uma percepção sem lastro factual).
Reconhecer esses desafios é essencial para uma visão equilibrada da relação entre fotografia e bem-estar.
Arte, vulnerabilidade e expressão: o caso Michael Stipe

Um exemplo inspirador dessa interseção entre arte, fotografia e saúde mental vem de Michael Stipe, ex-vocalista da banda R.E.M., que há décadas usa a fotografia como meio de expressão emocional e autoconhecimento.
Conhecido por sua natureza introspectiva, Stipe revelou que muitas de suas imagens (frequentemente mostrando mãos, braços e nucas em vez de rostos) refletem timidez e vulnerabilidade, transformando o ato de fotografar em um espelho de si mesmo.
Ele descreve a fotografia como uma extensão da criatividade, uma forma de processar experiências e emoções tão essencial quanto compor música. O que começou como simples registro cotidiano evoluiu para um diário visual surrealista, com olhar sensível e simbólico sobre a vida.
Entre seus trabalhos mais conhecidos está o livro Our Interference Times: A Visual Record, que explora o cruzamento entre o analógico e o digital, revelando a tensão (e a harmonia) entre o humano e a tecnologia.

A banda R.E.M., por sua vez, sempre manteve uma ligação direta com causas de saúde mental. Além de apoiar o Sweet Relief Musicians Fund, que oferece suporte psicológico a profissionais da música, o grupo criou obras visuais derivadas das ondas sonoras de suas canções (como as de Everybody Hurts) para campanhas e leilões beneficentes.
Essas iniciativas conectam a fotografia, a música e a empatia como expressões de um mesmo gesto: transformar vulnerabilidade em arte e gerar impacto real na vida das pessoas.
Uma prática antiga, uma nova consciência
Embora a popularização seja recente, a relação entre fotografia e bem-estar tem raízes históricas profundas.
A fotografia médica/psiquiátrica do século XIX já era usada em instituições de saúde mental, como no trabalho pioneiro de Hugh Welch Diamond, que propunha o uso de retratos como ferramenta de reflexão e autoimagem.
Ao longo do século XX, a arteterapia ganhou força, e a fotografia passou a integrar as terapias expressivas como meio de autoconhecimento e cura simbólica.
A psicóloga Judy Weiser formalizou o conceito de photo therapy, no qual fotografias são usadas como recurso terapêutico supervisionado.E revisões recentes, como “Therapeutic Photography and Phototherapy: A Systematic Review”, mapearam dezenas de estudos fotográficos como intervenções efetivas em saúde mental.
Essas práticas formam o alicerce para a consolidação contemporânea da fotografia como linguagem de cuidado e bem-estar.
Um universo que se expande
A evidência de 2025 reforça que a relação entre fotografia e saúde mental não é uma moda passageira, na verdade é um campo em consolidação. Com bases científicas sólidas, tradição histórica e crescente reconhecimento público, a fotografia se afirma como uma forma legítima de cuidado, presença e expressão. E com a popularização de smarthphones e redes sociais, acaba se potencializando ainda mais.
Muito além do que uma arte ou profissão, fotografar é um gesto de conexão: entre o olhar e o mundo, entre a emoção e a memória, entre o indivíduo e o coletivo.
✅ Texto de serviço público: aberto ao público geral e aos fotógrafos.




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