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O Mito da Autenticidade: Quando o Real Vira Performance

A nova estética da verdade e como fotógrafos estão transformando o natural em estratégia de marca

Braxton Apana/Unsplash
Braxton Apana/Unsplash


Há um paradoxo no centro da fotografia contemporânea: quanto mais buscamos o real, mais ele se torna uma encenação. O espontâneo virou pose. O natural, um filtro cuidadosamente calibrado. E a autenticidade, essa palavra que parece redimir tudo, tornou-se o novo produto premium das imagens.

Vivemos numa era em que tudo pode parecer verdadeiro. A inteligência artificial desfaz as fronteiras entre o documentário e a simulação, enquanto as redes sociais transformam o cotidiano em vitrine. Mas a questão que divide os criadores de hoje não é mais “como capturar o real”. É como fazer o real parecer verdadeiro. E acredite: isso não é fácil...




A Era da Autenticidade Fabricada

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No relatório de tendências 2025 da Stills, há uma virada crucial: o público está cansado da perfeição. As fotos impecáveis da década passada perderam apelo. Em seu lugar surgiram imagens com flash direto, ruído visível, cortes abruptos e texturas de erro. “Queremos ver mais do bruto, do real, do acessível”, disse a criadora de conteúdo Victoria Stefania.

Mas o que acontece quando o bruto é meticulosamente ensaiado? Quando o erro é parte do plano? A autenticidade virou uma estética. E, como toda estética, pode ser reproduzida, vendida e inevitavelmente esvaziada.

O relatório chama isso de autenticidade encenada, um movimento que mistura nostalgia analógica, artefatos digitais e composição estratégica para produzir imagens que parecem honestas, mas são tão pensadas quanto uma campanha de luxo.




Michael Freeman e a Nova Verdade Composta

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Na entrevista recente com Michael Freeman, o fotógrafo fala sobre a importância da salience, a habilidade de destacar os elementos que tornam uma imagem inconfundivelmente sua. Ele afirma que o desafio atual não é apenas compor uma foto, mas desenhar uma percepção.

Freeman, que hoje colabora com a Apple em pesquisas sobre estética computacional, descreve como a era da IA trouxe uma nova camada à fotografia: a da análise semântica, onde cada pixel é interpretado e cada padrão aprendido. Nesse contexto, o que antes era instinto virou dado. E o olhar autoral passou a ser uma forma de resistência.

A autenticidade, portanto, não está mais no gesto de clicar, mas na intenção por trás da imagem. No design da verdade.




Da Música à Fotografia: o Branding da Verdade


A estrategista visual Natasha Brito define com precisão o impasse contemporâneo. Ao falar sobre artistas musicais, ela diz que vivemos o estágio final das redes sociais, um momento em que os criadores estão exaustos de performar autenticidade o tempo todo.

Para Brito, construir uma identidade visual hoje é um exercício de introspecção estratégica. Sua metodologia é quase meditativa: ela ouve uma música de olhos fechados e anota as imagens, cores e texturas que emergem, um processo sinestésico que transforma sensações em símbolos. O resultado é uma narrativa subliminar, um universo coerente que traduz sentimento em forma.

É uma lição direta para fotógrafos: a autenticidade não nasce da casualidade, mas da coerência emocional entre o que você sente e o que mostra.




A Coca-Cola e a Estética do Reconhecimento

Akshika Singh/Unsplash
Akshika Singh/Unsplash

A campanha “Contour” da Coca-Cola Global Design é um estudo magistral sobre autenticidade construída. Por uma década, os fotógrafos Guy Aroch e Anna Palma criaram uma linguagem visual que parecia casual, humana e instantânea, mas era resultado de uma precisão cirúrgica.

Cada imagem capturava momentos aparentemente espontâneos, um brinde, um gesto, uma risada. Mas o verdadeiro protagonista estava sempre ali, mesmo quando escondido: a garrafa contour. A forma, o reflexo, a cor. Sempre presente. Sempre reconhecível. A autenticidade da Coca-Cola estava na constância de sua assinatura visual.

Rapha Abreu, VP Global de Design da marca, resume de forma simples: o objetivo nunca foi vender uma bebida, mas um sentimento do qual as pessoas quisessem fazer parte. Essa é a essência da autenticidade estratégica: quando o real é projetado para parecer inevitavelmente verdadeiro.





O Fotógrafo Que Deletou o Próprio Real


Em um relato brutal e inspirador, o fotógrafo Luke Cleland compartilhou no Fstoppers (leia aqui) como precisou apagar boa parte do seu portfólio para descobrir sua identidade. Ele percebeu que fotografar de tudo um pouco o fazia parecer todos e ninguém ao mesmo tempo.

A virada aconteceu quando ele decidiu abraçar apenas um tipo de trabalho: casamentos. Mas não qualquer casamento, apenas aqueles que refletiam a suavidade, o romantismo e a luz que expressavam sua visão de mundo. O resto, ele deletou. “Foi doloroso, mas libertador”, diz.

A lição de Cleland ecoa o que Brito e Freeman já haviam apontado: autenticidade é edição, não acumulação. É a arte de deixar o essencial sobreviver.




Autenticidade Como Valor de Marca

Neil Daftary/Unsplash
Neil Daftary/Unsplash

O mito da autenticidade surge quando esquecemos que o real também precisa de direção. Fotógrafos documentais, publicitários, autorais e híbridos enfrentam o mesmo dilema: como ser verdadeiro sem parecer fabricado.

A resposta está menos na forma e mais na filosofia. Michael Freeman chama isso de salience. Natasha Brito chama de sinestesia narrativa. Guy Aroch e Anna Palma chamam de coerência emocional. Luke Cleland chama de clareza.

Todos estão falando da mesma coisa: identidade.

E talvez seja hora de aceitar que a autenticidade, essa nova moeda da era visual, não é o oposto da construção. Ela é a construção feita com verdade.


Para refletir

A fotografia não é mais apenas sobre capturar o mundo como ele é. É sobre projetar o que acreditamos ser verdadeiro. O espontâneo pode ser planejado. O natural pode ser desenhado. E isso não é uma traição da realidade, é a sua tradução.

Porque, no fim, o público não busca o real.Busca confiança. E confiança, assim como uma boa fotografia, nunca acontece por acaso.


Explore mais

Na comunidade Fotograf.IA + C.E.Foto, reunimos fotógrafos e criadores que exploram essas transformações com profundidade. Ali discutimos como o conceito de autenticidade está sendo redefinido pela inteligência artificial, pelo comportamento do público e pela própria linguagem visual.

E se você quer se aprofundar no tema e fortalecer o posicionamento da sua marca fotográfica, conheça o combo Anti-IA + Branding Fotográfico. Dois guias complementares que mostram como unir propósito, visão e diferenciação em um mercado onde o humano é o novo luxo.



 
 
 

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