A direção de fotografia de O Agente Secreto e o visual que coloca o Brasil em destaque no cinema mundial
- Leo Saldanha
- há 21 horas
- 4 min de leitura
Como a abordagem documental de Evgenia Alexandrova cria uma linguagem visual singular em “O Agente Secreto”, protagonizado por Wagner Moura

A fotografia do cinema brasileiro volta ao centro da conversa internacional com “O Agente Secreto”, novo filme de Kleber Mendonça Filho que chega às telas nesta quarta. A produção, escolhida para representar o Brasil na disputa do Oscar de Filme Internacional, chama atenção não só pela força política da narrativa, mas pelo trabalho da diretora de fotografia Evgenia Alexandrova, que explora uma estética que ela própria descreve como “jazz visual”.
Nesta matéria, uma visão completa dessa abordagem e de como isso rompe com padrões recentes da cinematografia, por que interessa a fotógrafos e criadores visuais, e o que o estilo de Alexandrova revela sobre a evolução da imagem no Brasil e no mundo.

Uma diretora de fotografia entre o documental e a ficção
Evgenia Alexandrova nasceu na Rússia e vive na França, mas tem relação profunda com o cinema brasileiro. Depois de filmar produções como “Heartless”, de Nara Normande e Tião, Kleber Mendonça Filho a convidou para traduzir visualmente o universo de Recife nos anos 1970.
O que se destaca no trabalho da cinematógrafa é a sua recusa em buscar apenas beleza estética. Em entrevista ao festival de Virginia, ela resumiu seu método de forma precisa: pensa menos em “como a imagem deve ficar” e mais em “o que a imagem significa para o personagem”.
Esse ponto é essencial para profissionais da fotografia. A imagem não é só aparência, mas intenção. É gesto. É posição. É contexto.
Um thriller político recriado com textura, movimento e luz
Ambientado em 1977, o filme acompanha Armando, vivido por Wagner Moura, um acadêmico perseguido pela ditadura militar. A reconstituição da época é minuciosa, mas nunca engessada. Alexandrova reconstrói a Recife do período com uma combinação rara de precisão histórica e liberdade visual.
Dois elementos se destacam:
• O uso constante de câmera na mão, que a diretora de fotografia chama de “intuição física”.
• O contraste profundo entre luz e sombra, evitando a tendência contemporânea de imagens planas e excessivamente polidas.
Essas escolhas aproximam o público da experiência emocional dos personagens e criam um tipo de realismo nervoso que se vê mais em documentários do que em obras de ficção.
Detalhes que constroem verdade: lentes da época e aberrações assumidas
Alexandrova decidiu filmar com lentes Panavision B Series, produzidas nos anos 1970. A opção não busca nostalgia gratuita. O objetivo é resgatar a forma como a luz se comportava no período, aceitando:
• aberrações;
• distorções;
• reações inesperadas à mistura entre tons escuros e claridade intensa.
Em um momento, a equipe chegou a discutir filmar trechos com smartphones para criar rupturas estéticas. Mas preferiram manter o mesmo equipamento e alterar apenas o tratamento de cor entre presente e passado. O resultado é uma camada narrativa construída pela própria luz, distinguindo épocas sem explicações didáticas.
A cena que vira metáfora: o “pé assassino” no parque
Um dos momentos mais comentados do filme retrata uma lenda urbana durante o carnaval, envolvendo um pé decepado que ganha vida em um parque. Pode soar absurdo, mas Kleber e Alexandrova transformam a sequência em metáfora visual da violência do Estado.
Filmada como se fosse um quadrinho sombrio, a cena funciona pela fluidez da câmera e pelo jogo de luz e escuridão que guia o espectador. É exemplar do “jazz visual” citado pela diretora: liberdade dentro da estrutura, improviso com propósito, movimento com sentido dramático.
Ponto de vista, política e presença feminina
Alexandrova descreve como cenas com a atriz Alice Carvalho ganharam força quando trocou o tripé pela câmera na mão. O gesto intuitivo criou uma conexão direta entre a tensão política, o desconforto vivido pela personagem e a sensação física trazida pela imagem.
O olhar feminino da diretora de fotografia também aproxima a obra de questões contemporâneas: representação, presença e voz.
Por que isso importa para fotógrafos e profissionais da imagem
A discussão vai muito além do cinema.
O trabalho de Alexandrova reposiciona três princípios fundamentais que vêm ganhando força na fotografia atual:
Luz imperfeita é expressiva
A busca pela imagem “perfeita” e “equilibrada” está perdendo espaço para abordagens mais contrastadas, profundas e emotivas.
Movimento pode ser linguagem, não defeito
Do vídeo ao ensaio documental, a câmera que respira junto ao personagem ou cliente cria proximidade e verdade.
Intuição visual supera rigidez técnica
Planejamento é importante, mas abrir espaço para o inesperado faz as imagens ganharem vida.
Kleber Mendonça Filho e Alexandrova mostram como a fotografia pode ser política, sensorial e narrativa ao mesmo tempo.

Mais uma obra que recoloca a cinematografia brasileira no mapa
“O Agente Secreto” estreia como um dos filmes visuais mais instigantes do ano. O olhar de Alexandrova, aliado à assinatura de Kleber, cria uma obra que deve virar referência tanto para o cinema quanto para a fotografia contemporânea. Depois do sucesso e consagração de "Ainda Estou Aqui" essa nova produção comprova o melhor momento do cinema brasileiro em muitos anos.
A estética documental aplicada à ficção, o rigor histórico conectado ao improviso e a coragem luminosa de abraçar sombras fazem do filme um marco visual.
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